Pesquisar em Adoro Saber!

Mostrando postagens com marcador Descritor 7. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Descritor 7. Mostrar todas as postagens

1 de abr. de 2015

Conto

CONTO

Conto "Restos de carnaval", de Clarice Lispector

É uma narrativa curta, cujo enredo desenvolve-se em torno de um único conflito. Esse conflito cria uma situação de tensão, que domina quase toda a narrativa e prende a atenção do leitor até o desfecho.


Momentos da narrativa em um conto

  • Situação inicial - Ambientação da história, com rápida apresentação dos fatos, cenário, personagens. É uma situação de calmaria. 
  • Conflito - quebra da calmaria inicial, com o surgimento de um "problema". Esse problema vai se desenvolver durante quase todo o conto. 
  • Clímax - Momento de máxima tensão da narrativa, é o auge do "problema". Algo do tipo "pior, não fica!"   
  • Desfecho - Resolução do conflito, logo após o clímax. Geralmente rápido e inesperado.

     Dentre os tipos mais conhecidos, temos os Contos de Fadas, os Contos Fantásticos, os Contos de mistério e de terror... Cada um deles tem sua especificidade quanto à linguagem, à temática, à época e lugar onde as histórias se passam, aos tipos de personagens. Mas todos eles seguem a mesta estrutura narrativa: o "problema" se desenrola durante quase toda a história e rapidamente se resolve ao final, dando um susto no leitor! 



🎧  Ouça nosso podcast sobre Gêneros textuais e não se confunda mais! 😉 🔊


📝 Leia mais sobre contos em Contos de Terror, Gêneros Textuais,  Elementos da narrativa.





A seguir, temos atividades com o conto “Restos de carnaval”, de Clarice Lispector. 


Restos do carnaval

Clarice Lispector
Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o outro ano. E quando a festa ia se aproximando, como explicar a agitação íntima que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.
No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.
E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.
Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça - eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.
Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com as quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.
Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga - talvez atendendo a meu apelo mudo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel - resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.
Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada: minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo, embaixo da fantasia usaríamos combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse pelo menos estaríamos de algum modo vestidas - à ideia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de vergonha - mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quanto ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho, que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.
Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.
Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto essa não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge - minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa - mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil - fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros me espantava.
Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.
Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos, já lisos, de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.
Conto publicado no livro Felicidade Clandestina, Ed. Rocco (http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/restos-carnaval-clarice-lispector-634375.shtml , acessado em 5/2/15)
 
 D1 – Localizar informações explícitas em um texto; D7 – Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa. 

1. Quem é o narrador da história? A menina que a viveu.
 
2. O conto gira em torno de um conflito. Que conflito é esse? Justifique sua resposta com passagens do texto.
O desejo da menina de fazer do carnaval, que ela tanto gostava, mas pouco participara.E quando a festa ia se aproximando, como explicar a agitação íntima que me tomava?” No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. “
 
3. Identifique, no texto, os parágrafos que marcam:
a) situação inicial: 1o parágrafo
b) Conflito: 2o ao 5o parágrafo
c) Clímax: 6o ao 10o parágrafo
d) Desfecho: 11o parágrafo

4. Que idade tinha a personagem principal do texto quando os fatos aconteceam? Como você soube disso?
Ela tinha 8 anos. Isso pôde ser observado na passagem “à ideia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos...”

5. Retire do texto trechos que indiquem como a menina se sentia com relação ao carnaval.
E quando a festa ia se aproximando, como explicar a agitação íntima que me tomava?”
Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.

 6. Que importância a maquiagem tinha para a menina? Justifique sua resposta com passagens do texto.
Ela queria sair da infância e tornar-se logo uma moça. Maquiada, ela se sentia menos criança e mais moça: “eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.”
o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil “

7. Observe: “Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto...Esse trecho mostra que o narrador-personagem conta os fatos em um tempo diferente do acontecido. Em que momento da vida da protagonista ocorreram os fatos narrados?
Na infância dela.


8. Em que momento da vida da protagonista ela nos conta sua história? Justifique com passagens do conto.
A protagonista já é adulta quando narra os fatos. “ este me transportou para a minha infância”; “Nunca tinha ido a um baile infantil...”; “eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável “

6 de ago. de 2013

Narração em prosa

Era uma vez - Edição de Dezembro de 2000


      No último dia de férias, Lilico nem dormiu direito. Não via a hora de voltar à escola e rever os amigos. Acordou feliz da vida, tomou o café da manhã às pressas, pegou sua mochila e foi ao encontro deles.  
     Abraçou-os à entrada da escola, mostrou o relógio que ganhara de Natal, contou sobre sua viagem ao litoral. Depois ouviu as histórias dos amigos e divertiu-se com eles, o coração latejando de alegria. Aos poucos, foi matando a saudade das descobertas que fazia ali, das meninas ruidosas, do azul e branco dos uniformes, daquele burburinho à beira do portão. Sentia-se como um peixe de volta ao mar. Mas, quando o sino anunciou o início das aulas, Lilico descobriu que caíra numa classe onde não havia nenhum de seus amigos. Encontrou lá só gente estranha, que o observava dos pés à cabeça, em silêncio. Viu-se perdido e o sorriso que iluminava seu rosto se apagou.
    
      Antes de começar, a professora pediu que cada aluno se apresentasse. Aborrecido, Lilico estudava seus novos companheiros. Tinha um japonês de cabelos espetados com jeito de nerd. Uma garota de olhos azuis, vinda do Sul, pareceu-lhe fria e arrogante. Um menino alto, que quase bateu no teto quando se ergueu, dava toda a pinta de ser um bobo. E a menina que morava no sítio? A coitada comia palavras, olhava-os assustada, igual um bicho do mato. O mulato, filho de pescador, falava arrastado, estalando a língua, com sotaque de malandro. E havia uns garotos com tatuagens, umas meninas usando óculos de lentes grossas, todos esquisitos aos olhos de Lilico. A professora? Tão diferente das que ele conhecera... Logo que soou o sinal para o recreio, Lilico saiu a mil por hora, à procura de seus antigos colegas. Surpreendeu-se ao vê-los em roda, animados, junto aos estudantes que haviam conhecido horas antes.
     
      De volta à sala de aula, a professora passou uma tarefa em grupo. Lilico caiu com o japonês, a menina gaúcha, o mulato e o grandalhão. Começaram a conversar cheios de cautela, mas paulatinamente foram se soltando, a ponto de, ao fim do exercício, parecer que se conheciam há anos. Lilico descobriu que o japonês não era nerd, não: era ótimo em Matemática, mas tinha dificuldade em Português. A gaúcha, que lhe parecera tão metida, era gentil e o mirava ternamente com seus lindos olhos azuis. O mulato era um caiçara responsável, ajudava o pai desde criança e prometeu ensinar a todos os segredos de uma boa pescaria. O grandalhão não tinha nada de bobo. Raciocinava rapidamente e, com aquele tamanho, seria legal jogar basquete no time dele. Lilico descobriu mais. Inclusive que o haviam achado mal humorado quando ele se apresentara, mas já não pensavam assim. Então, mirou a menina do sítio e pensou no quanto seria bom conhecê-la. Devia saber tudo de passarinhos. Sim, justamente porque eram diferentes havia encanto nas pessoas. Se ele descobrira aquilo no primeiro dia de aula, quantas descobertas não haveria de fazer no ano inteiro? E, como um lápis deslizando numa folha de papel, um sorriso se desenhou novamente no rosto de Lilico.

Texto de João Anzanello Carrascoza Ilustrado por Daisy. Revista Nova escola online: Acessado em 08/12/2006

Trabalhando com o texto... 

D1 – Localizar informações explícitas em um texto; D3 – Inferir o sentido de uma palavra ou expressão; D4 – Inferir uma informação implícita em um texto; D7 – Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa; D12 – Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções, advérbios etc.
  1. Esse texto conta uma história? História de quê?
  2. Quais foram os sentimentos vividos pelo personagem Lilico? 
     
  3. Quem são as personagens desta história? 
     
  4. Há uma personagem principal? Justifique sua resposta utilizando elementos do texto.
  5. O narrador dos fatos é também um personagem? Como você chegou a essa conclusão?
  6. Onde se passa a história? 
     
  7. Qual foi o tempo de duração dos fatos narrados e que recursos linguísticos o autor utilizou para sinalizar/indicar esse tempo?
  8. É possível afirmar que o texto apresenta uma introdução, o desenvolvimento e um desfecho? Procure marcar no texto essas três partes.
  9. Lilico teve oportunidade para refletir e mudar a sua visão a respeito de seus novos colegas? O que ele descobriu a respeito deles?
  10. Leia os fragmentos abaixo, extraídos do texto:
Trecho 1:
O último dia de férias, Lilico nem dormiu direito. Não via a hora de voltar à escola e rever os amigos. Acordou feliz da vida, tomou o café da manhã às pressas, pegou sua mochila e foi ao encontro deles. Abraçou-os à entrada da escola, mostrou o relógio que ganhara de Natal, contou sobre sua viagem ao litoral. Depois ouviu as histórias dos amigos e divertiu-se com eles, o coração latejando de alegria”

Trecho 2:
     “Encontrou lá só gente estranha, que o observava dos pés à cabeça, em silêncio. Viu-se perdido e o sorriso que iluminava seu rosto se apagou. Antes de começar, a professora pediu que cada aluno se apresentasse. Aborrecido, Lilico estudava seus novos companheiros”.
    1. O que sinalizam as palavras em negrito? 
       
    2. Que efeitos de sentido o uso dessas palavras provoca? Por que esse tipo de recurso é importante na narrativa?

11 . Releia o trecho abaixo, retirado do texto:
 
Sentia-se como um peixe de volta ao mar. Mas, quando o sino anunciou o início das aulas, Lilico descobriu que caíra numa classe onde não havia nenhum de seus amigos”.
    1. Por que a personagem Lilico disse que sentia-se “um peixe de volta ao mar”?
    2. Que efeito de sentido o uso da palavra “mas” (em negrito) provoca? Que outra palavra pode substituir o “mas” sem provocar prejuízo de sentido para o texto?



Leia mais em: Elementos da Narrativa


Referência:
  • COSTA VAL, Maria da Graça. Texto, textualidade e textualização. IN: CECCANTINI, J.L. Tápias; PEREIRA, Rony F.; ZANCHETTA JR., Juvenal. Pedagogia Cidadã: cadernos de formação: Língua Portuguesa. v. 1. São Paulo: UNESP, Pró-Reitoria de Graduação, 2004. p. 113-124, In http://crv.educacao.mg.gov.br

Postagens populares